domingo, 2 de dezembro de 2007

O MySpace e o Brasil

O MySpace já montou uma pequena equipe no Brasil, e o lançamento oficial deve acontecer ainda este ano. Conversei por telefone com um dos fundadores, Chris DeWolfe. Um pequeno trecho foi publicado na edição atual da EXAME. Eis a íntegra da conversa.

Publicado em 29/11/2007 - 13:02
Acesse o artigo original: Revista EXAME


O MySpace pertence a um grande grupo de mídia, o News Corp. Como a empresa vê o MySpace? Redes sociais têm impacto enorme nos hábitos de consumo da mídia tradicional, como o senhor acaba de apontar. O site é uma ameaça para o negócio da News Corp?
Uma das vantagens de trabalhar para a News Corp. é que a organização sempre foi muito empreendedora. Rupert Murdoch começou tudo com um jornal regional em Adelaide, na Austrália. Nos anos seguintes, ele reinventou o negócio da mídia quatro ou cinco vezes. Consolidou pequenos jornais e gráficas, expandiu-se internacionalmente, lançou uma quarta rede nacional de TV (a Fox, nos Estados Unidos), depois lançou uma segunda rede de notícias 24 horas (a Fox News), quando todos diziam que isso era impossível. E, nos últimos dois anos, com a compra do MySpace, ele criou um negócio enorme na internet, o site de maior audiência dos Estados Unidos. Ele entende da mídia. Sabe que a publicidade está migrando para a internet. Ao mesmo tempo, ele enxerga várias sinergias entre as empresas da News Corp. Por exemplo: temos vídeos da Fox no site, e eles nos trazem publicidade. Promovemos vários filmes do estúdio de cinema e fazemos o lançamento de programas de TV no MySpace.

Então o senhor não acredita que o MySpace pode representar uma ruptura no negócio da News Corp?
Certamente estamos somando. Os hábitos dos telespectadores mudaram muito nos últimos, como você sabe. E os responsáveis são os consumidores. Eles querem ver filmes ouvir música quando quiserem, na forma que quiserem, onde quiserem. As empresas de mídia não têm escolha: elas têm de atender as demandas dos consumidores. Então, por um lado, temos o benefício do excelente conteúdo da News Corp. Por outro, porém, também representamos uma ruptura, tomando o tempo das pessoas e fornecendo ferramentas as tecnológicas que permitiram essa grande mudança de hábitos.

E do lado dos anunciantes? Uma rede como o MySpace pode ser muito mais eficiente e precisa para a exibição de mensagens comerciais do que um anúncio na TV aberta, não? Isso não é uma ruptura?
Esperamos que sim (risos). Temos muitas informações sobre nossos usuários e, com isso, podemos fazer um marketing muito bem direcionado. Sabemos quem gosta de filmes de terror ou quem curte carros antigos. Podemos entregar a publicidade certa, para a pessoa certa, na hora certa. A publicidade está migrando de forma inevitável para a internet, e o MySpace está muito bem posicionado para se beneficiar dessa mudança.

Por que lançar no Brasil?
Somos o maior site dos Estados Unidos. Mas, em cinco anos, a maioria dos nossos usuários, receitas e lucros vão vir de outros países. E certamente o Brasil é um dos maiores mercados do mundo. Tem uma cultura de muito uso da internet, e que tem tudo a ver com o MySpace. Antes mesmo do lançamento oficial e da tradução do site, temos um bom tráfego. Já são mais de 8 000 bandas brasileiras que estão no MySpace.

O senhor fala em ter todos os meus círculos sociais no MySpace. Pensando assim: há espaço para outras redes concorrentes? Pergunto porque no Brasil o Orkut é muito grande. Por esse raciocínio, seria muito difícil conquistar o público brasileiro.
Sabemos que o Orkut é muito grande no Brasil, mas o MySpace é diferente. Nosso negócio é a autoexpressão, a descoberta de novas pessoas, novas culturas, novos conteúdos. Todas as páginas do MySpace são diferentes. Elas representam o que o usuário é na vida real, assim como uma casa ou um quarto. Elas são de fato pessoais e dizem muito a respeito dos seus donos. Sites como o Orkut e Facebook são muito interessantes, mas mais parecidos com ferramentas. Como um e-mail, por exemplo. Nós também fazemos isso, mas vamos além. Dito isso, acredito que haja espaço para mais de uma rede social, e o MySpace certamente é diferente. Por isso somos o número 1 do mundo.

Mas o senhor acredita que as pessoas vão trocar o Orkut por outra rede? Ou vão manter páginas em duas redes?
Alguns vão trocar, outros vão ter perfis em duas redes, talvez. Poucos vão conseguir lidar com mais que isso. O dia tem apenas 24 horas. O MySpace toma muito tempo. Hoje, temos 12% de todo o tempo que os americanos passam online.

O MySpace começou como um site voltado para músicos e depois se transformou na maior rede social do mundo. Como foi essa transição? Foi planejado?
Muitos de nossos amigos eram músicos da região de Los Angeles, e eles foram os primeiros a criar seus perfis no site. Sentíamos falta de um serviço em que artistas pudessem mostrar seu trabalho e que também servisse para as pessoas encontrarem novas músicas. A rádio nos Estados Unidos, e na maioria dos outros países, é programada por grandes empresas, e as mesmas músicas são repetidas à exaustão. Mas desde o começo havia também muitos atores, comediantes, donos de clubes e assim por diante. Temos mais ou menos 250 milhões de perfis no MySpace. De 3 milhões a 4 milhões deles são de bandas ou músicos, e essas páginas respondem por cerca de 1% da nossa audiência.

Muita gente diz que as redes sociais vão ser a próxima grande onda da internet, o ponto de partida para toda a navegação na web. O senhor concorda?
Tenho alguns pontos a destacar. Em primeiro lugar, somos a maior rede do mundo, então nossos usuários estão conectados globalmente. Em segundo lugar, acredito que o acesso às redes será cada vez mais independente da plataforma, ou seja, os aparelhos móveis serão cada vez mais importantes. Também somos uma plataforma de inovações. Assim como há milhões de bandas no mundo que colocam suas músicas no site, há milhões de programadores que podem criar produtos legais integrados ao MySpace. Vemos muito das nossas futuras inovações vindo desses desenvolvedores independentes. Outro ponto importante: acreditamos que o MySpace vai ser seu endereço na internet. Você, no futuro, poderá personalizar sua página de várias maneiras. Haverá o círculo dos seus amigos mais próximos, por exemplo, e outro para os colegas do trabalho e um terceiro para a sua família. Qualquer que seja a pessoa olhando o seu perfil, ele será relevante. Finalmente, acreditamos que o site será a porta de entrada na web. Além de saber o que acontece com seus amigos, você poderá ver o que há de mais legal na internet. Pode ser a previsão do tempo, seu email, o seu canal favorito de notícias. Finalmente, haverá muito conteúdo que você poderá consumir. Além da música, estamos licenciando conteúdo de vídeo dos principais estúdios do mundo, desde a NBA, passando pela BBC e pelas grandes redes de TV.

O senhor acredita que as redes sociais serão um microcosmo do que há na internet?
Exatamente. E de forma personalizada, levando em conta sempre os seus interesses.

E como os usuários das redes sociais vão se tornar “marqueteiros”, recomendando produtos e serviços para seus amigos?
Isso já está acontecendo. Fazemos isso há três anos. Um anunciante pode criar um perfil para sua marca ou seu produto, que é adicionado como “amigo” por um usuário. O Fusion, da Ford, pode estar na minha lista, e meus amigos vão ver isso e poderão adicioná-lo também caso se identifiquem com o carro. E há outras maneiras, mais orgânicas, de divulgação. A Abercrombie and Fitch (grife americana) tem uma página que não foi criada pela empresa, mas sim por fãs da marca. Assim como as pessoas se identificam com os livros que lêem ou a música que ouvem, elas também mantêm uma relação próxima com suas marcas prediletas.

Mas muito se fala a respeito do cinismo do consumidor dos dias de hoje, ainda mais no que diz respeito à divulgação de empresas.
Em primeiro lugar, acontece naturalmente. Nós vivemos num mundo de marcas. As pessoas têm orgulho das marcas que escolhem. Mercedes diz algo a respeito de uma pessoa. Ford diz algo a respeito da pessoa. O usuário do MySpace interage com as marcas como se ela fosse uma pessoa. Ninguém recebe nada por isso. Já vi exemplos de empresas que tentaram criar um boca-a-boca forçado. Isso claramente não funciona.

O MySpace entrou para o consórcio OpenSocial, junto com o Google e outras redes sociais. Por quê?
Queremos nos aproveitar da comunidade de programadores espalhada pelo mundo. Se você é um desenvolvedor e quer integrar seu software com alguns sites, tem de fazer diversas adaptações. O sistema OpenSocial permite que a criação de um só código, que pode ser distribuído por vários sites.

Alguma aplicação já foi lançada?
Ainda não. Temos algumas em testes com alguns usuários. É um serviço muito legal de resenhas de filmes. Ele deve ser liberado para todos os usuários em um mês, um mês e meio.

E o modelo de negócios? Os criadores de software poderão ficar com as receitas de publicidade que venderem em seus programas ou haverá algum tipo de compartilhamento?
Os desenvolvedores vão ficar com toda a receita que conseguirem gerar. Esses programas são como mini-sites da web, mas dentro do MySpace. Se os programadores quiserem vender a publicidade, tudo bem. Se quiserem nossa ajuda para vender, também poderemos fazê-lo, talvez com mais eficiência, pois temos muitas informações sobre a base de usuários. Não vamos oferecer somente a plataforma de distribuição do software, podemos também entregar esse serviço de venda de espaços publicitários.

Publicado em 29/11/2007 - 13:02
Acesse o artigo original: Revista EXAME